EDITORIAL


Quando eu me poupe a falar,
Aperta-me a garganta e obriga-me a gritar!
José Régio


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20160831

Viriato e a "Cava de Viriato"


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As referências a Viriato e à “Cava de Viriato” no livro “Viagem ao Passado Romano na Lusitânia”, de Lídia Fernandes, “Esfera dos Livros”/Lisboa, publicado no passado mês de Junho, nada de novo acrescentam ao já conhecido, nem é esse o seu objecto. Com referência ao “Herói Mítico de Viseu” são enumerados como principais divulgadores da personagem, três autores portugueses e as respectivas obras, Luís de Camões (“Os Lusíadas”, 1572), Brás Garcia de Mascarenhas (“Viriato Trágico”, 1699) e sobretudo o alemão Adolf Schulten (“Viriato”, 1927). Foram estes autores quem mais contribuiu para a apropriação e criação do mito “do primeiro português”, o herói que encabeçou a resistência à ocupação pelos romanos da Hispania. A Lusitânia na verdade só passou a existir, como região administrativa, a partir do ano 27 a.C.. Os lusitanos agrupados em tribos não possuíam um sistema centralizado de poder e seriam a uma pequena parte de uma mescla de vários povos da Hispânia. Ocupavam um território entre o Douro e o Tejo que entrava pela actual Espanha. Os vários grupos que habitavam a península, teriam apenas alguns usos comuns mas falavam várias línguas. Viriato significaria aquele que usa a “viria” (bracelete ou pulseira) dignidade reservada aos guerreiros mais notáveis. Na cultura ibérica e sobretudo na celtibérica é comum a representação de guerreiros usando “torques”, colares metálicos circulares que poderiam ser de ouro. Existem várias estátuas de pedra, identificadas como combatentes lusitanos e vários “torques”, sendo o mais precioso o exposto no Museu Nacional de Arqueologia (Lisboa), proveniente de Vilas Boas (Vila Flor, Bragança). Outras peças comprovam que a arte da ourivesaria era bastante refinada, os povos que as produziam não eram tão rudes como se poderia pensar. Mas “Viriatos”, chefes militares, houve vários! Para a criação do forte mito de Viriato e conhecimento dos lusitanos, foram fundamentais as fontes clássicas (geógrafos e historiadores romanos e gregos) como Apiano, Políbio, Possidónio, Tito Lívio, Plínio e Estrabão. Maioritariamente os seus relatos não são contemporâneos e os factos são descritos dum ponto de vista exterior, o dos conquistadores. Na realidade desconhecemos, com exactidão a que família pertenceu Viriato, onde nasceu, como cresceu, onde passou a juventude e onde aprendeu as artes da guerra. São várias as localidades, de ambos os lados da fronteira, a reclamar ter sido o berço de Viriato. Folgosinho, Linhares, Loriga, Seia, Gouveia, Cabanas de Viriato e Viseu disputam essa honra. O chefe dos lusitanos deu nome a várias ruas e praças de localidades portuguesas. Em Portugal existem estátuas de Viriato em Lisboa, Folgosinho, Cabanas de Viriato mas a mais conhecida está em Viseu, frente à denominada “Cava de Viriato”. Em Zamora, a 100 km de Bragança, existe uma Praça de Viriato, onde em 1903 foi erigida uma estátua de Eduardo Bárron, com a legenda “Terror Romanorum” (“Terror dos Romanos”), porque o Viriato é igualmente reclamado como herói espanhol. A estátua de Viseu, da autoria do artista espanhol Mariano de Benlliure (1940) é marcada pelo realismo, como se comprova pela modelação das seis figuras que tiveram como modelos pessoas comuns, com variadas profissões manuais, escolhidas em Viseu, com especial cuidado posto na figura de Viriato, inspirada no corpo atlético de José Alves Madeira. Assim descrita por Lídia Fernandes: “Com os cabelos ao vento, em atitude de desafio e os olhos postos no horizonte, encontra-se em posição de combate, com as suas fortes pernas fletidas e o escudo erguido no seu braço direito”. (1)
A ligação do Viriato à vizinha construção octogonal com 2.000 metros de perímetro, em terra batida constituída por fortes paredões, outrora protegidos por um fosso com água, foi reforçada com a instalação em 1940 do conjunto escultórico do mítico herói da cidade. Esse foi um ano de grandes celebrações Nacionalistas, promovidas pelo Estado Novo.

1 – O Viriato não terá sido canhoto a falcata (arma temível por ser curva e ter dois gumes) está na mão direita da estátua de Mariano Benlliure e o escudo (caetra), na esquerda mas a proteger o peito. Os pequenos escudos de madeira, reforçados com couro ou metal, também eram usados como arma de ataque. Trata-se de um erro que deverá ser corrigido na 2ª edição.
Continua...